Wednesday, June 15, 2011

the dream of built-up realities

Ando em um local que me parece um bosque. Um parque ecológico ou uma trilha, talvez. Vasculhando minha mochila, encontro um relógio que não é meu. Não sei como o objeto foi parar ali, mas decido usar porque gosto do acessório. Ele é bem bonito, em sua maioria branco, com alguns detalhes em preto. Ele é analógico mas também tem um pequeno visor digital.

A alguma distância, vejo uma garota passando por cima das raízes de uma árvore, se equilibrando para não cair. Como já estou ficando cansado e entediado da longa caminhada, resolvo me aproximar a fim de arrumar companhia para terminar o passeio. Não que ela seja feia, mas sua aparência não é a primeira coisa que me desperta interesse na garota. Ela tem cabelos ruivos, lisos e compridos até as costas. O jeito dela se mover e seu sorriso ao me ver, de alguma forma, mexem comigo.

Apesar de sorrir, ela não me permite aproximar. Não percebo nenhum tipo de medo ou repúdio nela, então continuo tentando aproximar. Ela passa a correr de mim com a mesma expressão em seu rosto. Começa a chover.

Corro atrás dela até sairmos do bosque, entrando em uma cidade de construções antigas e ruas de paralelepípedo.

Com as pernas e roupas sujas de pisar em poças de água e lama, ela encosta em uma parede, se vira para mim, abaixa seu corpo um tanto com os joelhos dobrados para dentro e me espera, ainda sorrindo. Ainda sem saber ao certo o que me move, apoio minhas mãos na chão, em torno de sua cintura e nos beijamos. Ela sussurra algo em meu ouvido sobre um lugar para nos encontrarmos.

Em um flash, estou de volta ao bosque, mas tudo está muito diferente. Todo o meu redor é construído de blocos que exibem a paisagem em forma de textura. Polígonos formam as árvores, rochas e até mesmo a água corrente flui através deles em uma imagem contínua, porém, são diferentes do lugar no qual eu estivera. As árvores se curvam de maneira não-natural, o gramado é tão verde que quase brilha. Uma figura holográfica do que me parece uma mistura de sapo com uma vitória-régia passa voando por cima da minha cabeça.

Enquanto observo este mundo fantasioso, lembranças de uma vida inteira passa por minha cabeça, terminando em um final terrível. Em um campo aberto, passeio com a moça dos cabelos ruivos. A partir do horizonte, todo o movimento do mundo vem cessando conforme ele se torna cinza, paralisando a moça também, sendo eu o único ser ou objeto com vida ali. Uma chama negra e vermelha sai de seu peito e é engolida por um buraco negro que surge acima de nós e fecha em seguida.

Voltando a prestar atenção nos arredores, avisto à distância a moça ruiva com quem eu supostamente teria tido uma vida. No entanto, antes dela, um homem de cabelos cacheados, negros e até os ombros, com calças largas como a de um samurai e vestindo também uma espécie de bata, encontra-se parado me olhando.

Parto em direção à moça, desta vez com um objetivo claro em mente. Preciso contar à ela o que aconteceu e, apesar de saber que soarei como louco, com seu jeito que me conquistou e aquele seu sorriso misterioso, sinto que me entenderá.

O homem das calças de samurai me pergunta algo sobre uma ampulheta que eu não dou muita atenção, respondendo que eu não tenho ampulheta alguma comigo.

O sentimento de que a moça me compreenderá vai muito além. Não querendo aceitar, minha mente propõe que ela é, de alguma forma, a causa do que está acontecendo, mas não consigo me impedir de tentar fazer algo para tê-la novamente e para tentar evitar aquele destino.

Deixe-a ir – diz o homem das calças de samurai.
Não! A chama do seu coração dela vai ser levada e você sabe o que acontece por lá! Não posso deixá-la sofrer desse jeito!
Mas viu o que aconteceu da última vez! Precisamos fazer de outra forma. Você precisa seguir sua vida sem ela!


Ela está descendo uma ladeira naquele mundo artificial, desviando de raízes exibidas nos paineis sob seus pés, fazendo o mesmo que fazia quando a conheci. Sorriso. Perseguição, sujeira, cidade, parede. Percebo no centro do meu relógio de pulso, a partir de onde os ponteiros giram, uma ampulheta vazia.

Beijo-a novamente. Tomado por esse encanto, não consigo conversar com ela sobre o que nos espera. Ela sussurra novamente palavras para nos encontrarmos em algum lugar e decido discutir o assunto com ela nesta próxima ocasião.

Caminho alguns minutos pela cidade e entro em minha casa. Exceto por alguns detalhes, a casa é predominantemente branca. Paredes, móveis, roupas, aparelhos eletrônicos. O homem das calças de samurai está lá, como se ali morasse. Olho meu relógio.

– Ei, eu acho que eu estraguei feio as coisas – digo. Ele me olha sério.
– Lembra quando você me perguntou se eu não tinha nada que lembrasse uma ampulheta? Tem uma nesse relógio – silêncio; – mas já está vazia há um tempo!

Ele caminha em direção ao seu quarto e eu o sigo. Tira de sua mochila um relógio de corda ticando. Vira de o rosto pra mim e com um olhar irônico. Fico sem entender a situação por algum tempo e olho a ampulheta em meu relógio novamente. Está cheia.

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